o de sempre

"Conheço-me? não me conheço? estou baralhado de todo? Ou fui sempre"
Luiz Pacheco

o de sempre

segunda-feira, janeiro 26, 2009
Cantarolar Fausto* (o Bordalo Dias), quando o nosso pacto com o diabo não é pela sabedoria, mas pelo bolso aconchegado.

Roupa Velha

Rapariguinha
cose a tua saia
velha de cambraia
que outra não podes comprar
baixa a bainha
rasga o pé-de-meia
quando é magra a ceia
quem nos há-de aguentar
oh bonitinha

A que preço está o peixe
na corrida
a xaputa já é truta
promovida
puxa da massa apalpa a fruta
insecticida
fez a pileca da vitela
uma investida
e a salsicha “isidora”
é alheira de Mirandela

A que preço está a couve
e o grão-de-bico
bacalhau quase não há
deu-lhe o fanico
tenho prisão de ventre oh pá?
eu já te explico
o feijão-frade subiu ao céu
vende o penico
se não há grelos no mercado
há bons nabos no hemiciclo

Guarda a roupa velha
que sobra do almoço
dá o braço à Maria
ao Manel e ao Joaquim
não vás devagarinho
faz da praça um alvoroço
leva-me contigo
ai!! não te esqueças de mim
rapariguinha
cose a tua saia
velha de cambraia
que outra não podes comprar
baixa a bainha
rasga o pé-de-meia
quando é magra a ceia
quem nos há-de aguentar
oh bonitinha

A que preço está o vinho
nessa pipa
arde o preço da aguardente
queima a tripa
a água-pé é um detergente
só constipa
já não gosto da cerveja
dessa tipa
e a jeropiga a martelo
é servida em bandeja

A que preço está a casa
nessa esquina
não se aluga só se vende
é uma mina
quem a vende tem juros
lucros
alucina
quem não tem casa inventa
imagina
sonha ao relento é multado
mora em barraca clandestina

Guarda a roupa velha
que sobra do almoço
dá o braço à Maria
ao Manel e ao Joaquim
(…)

Como vai a nossa vida
de chinelo
pelo custo não é festa
é um duelo
o cabaz da fome é caro
magricela
mais barato é o discurso
tagarela
nada diz nada acrescenta
nem mexe o fundo à panela

* do Latim faustus, auspicioso, sortudo

Fausto - Histórias de Viajeiros (1979) - e a porra da letra tão actual

domingo, dezembro 07, 2008
Conversa na rua

De marioneta na mão, oferece um passou-bem e interrompe conversa. O aperto de mão é recusado, era outro o aperto, e o coração disparado não queria interrupções. Meio ofendido e furioso com a recusa, vira as costas a dizer:
- Pode ser que morras!
A única retaliação que saiu foi:
- É igual...

(segue sempre em rodapé, 'o dia não pode ser igual' e não é, quando tudo se torna igual perante o alerta da morte)

sexta-feira, novembro 28, 2008
Dos dias frios, que ficam gelados.



Portishead - Magic Doors
(This one goes out to G.)

segunda-feira, outubro 20, 2008
“Talvez pudesse ouvir passos junto à porta do quarto, passos leves que estacariam enquanto a minha vida, toda a vida, ficaria suspensa. Eu existiria então vagamente, alimentado pela violência de uma esperança, preso à obscura respiração dessa pessoa parada. Os comboios passariam sempre. E eu estaria a pensar nas palavras do amor, naquilo que se pode dizer quando a extrema solidão nos dá um talento inconcebível. O meu talento seria o máximo talento de um homem e devia reter, apenas pela sua força silenciosa, essa pessoa defronte da porta, a poucos metros, à distância de um simples movimento caloroso. Mas nesse instante ser-me-ia revelada a essencial crueldade do espírito. Penso que desejaria somente a presença incógnita e solitária dessa pessoa atrás da porta. Ela não deveria bater, solicitar, inquirir”

Herberto Helder em "Os passos em volta"


PorMim

quarta-feira, outubro 08, 2008
Associação livre de notícias
Ora bem...

e isto para não falar da 'crise'

O nobel da física foi atribuído, entre discussões de matéria e antimatéria, à teoria* da assimetria enquanto princípio originário do universo (bravo um ponto a favor das desarmonias).

Alheio a tudo isto (ou quanto mais penso, talvez não), um xeque saudita, de fatwa na liga, senhor dono do decoro, quer que as mulheres saiam à rua apenas com um olho a descoberto (para que não se sintam tentadas a usar maquilhagem). Permite-lhes que usem os dois olhos quando estiverem a fazer compras, mas apenas por um tempo limitado.

A assimetria é transversal à natureza (humana) ou sou eu que estou a ver coisas? Deve ser por usar dois olhos...

Tenho o desabafo feito!

*quando a física se deixar de teorias e passar à prática, vai tudo "c'o c#$%&?!" como diria o meu paizinho...

terça-feira, setembro 23, 2008
Só ele para me fazer voltar [com(o) o outono]



I know I'll miss...

quarta-feira, julho 02, 2008
Requiem de Verdi - Dies irae, dies illa - Conduzido por Karajan




Dies irae, dies illa
solvet saeclum in favilla,
teste David cum Sybilla.

Quantus tremor est futurus,
quando judex est venturus,
cuncta stricte discussurus.

Tuba mirum spargens sonum
per sepulchra regionum,
coget omnes ante thronum.

Mors stupebit et natura,
cum resurget creatura,
judicanti responsura.

Liber scriptus proferetur,
in quo totum continetur,
unde mundus judicetur.

Judex ergo cum sedebit,
quidquid latet apparebit,
nil inultum remanebit.

Quid sum miser tunc dicturus?
Quem patronum rogaturus,
cum vix justus sit securus?

Rex tremendae majestatis,
qui salvandos salvas gratis,
salva me, fons pietatis.

Recordare Jesu pie,
quod sum causa tuae viae,
ne me perdas illa die.

Quaerens me sedisti lassus,
redemisti crucem passus,
tantus labor non sit cassus.

Juste judex ultionis,
donum fac remissionis
ante diem rationis.

Ingemisco tanquam reus,
culpa rubet vultus meus,
supplicanti parce, Deus.

Qui Mariam absolvisti,
et latronem exaudisti,
mihi quoque spem dedisti.

Preces meae non sunt dignae,
sed tu, bonus, fac benigne,
ne perenni cremer igne.

Inter oves locum praesta,
et ab hoedis me sequestra,
statuens in parte dextra.

Confutatis maledictis,
flammis acribus addictis,
voca me cum benedictis.

Oro supplex et acclinis,
cor contritum quasi cinis,
gere curam mei finis.

Lacrimosa dies illa,
qua resurget ex favilla

judicandus homo reus -
Huic ergo parce, Deus.

Pie Jesu Domine,
dona eis requiem.

Amen.

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